Subtenente Molina é condenado a 61 anos em ação deflagrada por “rolê” de Ferrari

Com o fio da meada em passeio de Ferrari avaliada em R$ 600 mil no rodeio de Mundo Novo, a Operação Laços de Família resultou em condenação de 61 anos para o subtenente Silvio Cesar Molina Azevedo, policial militar afastado. Os crimes são tráfico de maconha e lavagem de dinheiro. A família Molina foi alvo da operação da PF (Polícia Federal) em 25 de junho de 2018. À época, as redes sociais mostravam o estilo ostentação, com veículos de luxo, viagem para Europa e festas de arromba.

Três anos depois, a sentença do juiz federal Bruno Cezar da Cunha Teixeira, titular da 3ª Vara da Justiça Federal de Campo Grande, condenou quinze pessoas. Conforme a decisão, o passeio de Jefferson Henrique Piovezan Azevedo Molina numa Ferrari F430, que custa R$ 630 mil, chamou a atenção no rodeio de Mundo Novo, cidade de 18.578 habitantes e a 463 km de Campo Grande. Jefferson é filho do policial militar e foi assassinado em junho de 2017, numa conveniência da cidade.

O alerta soou do MPMS (Ministério Público de Mato Grosso do Sul), que comunicou a “expressiva evolução patrimonial da família do servidor público mencionado, bem como os indícios de corrupção, contrabando e sonegação”.

No processo, Douglas Alves Rocha, cunhado de Jefferson, alegou motivo passional para a família Molina ter virado alvo de investigação. Ele negou as acusações e disse que sofreram injusta perseguição de delegado da Polícia Federal, cujo nome não foi divulgado. “Diz que o delegado tinha diferenças com Jefferson em decorrência de uma namorada sua, e que então o delegado manipulou todos para focar a investigação sobre a família de Silvio, manipulando o juiz (estadual) para mudar a data do júri após a operação e, ainda, teria transferido o júri de Bodinho para a “cidade dele” (Naviraí/MS)”. Em maio de 2019, Douglas, foi julgado em Naviraí por crime de homicídio ocorrido em Mundo Novo.

Ferrari fazia parte da frota ostentação da família Molina. (Foto: Reprodução/Facebook)

Outros argumentos citados foram vingança de contrabandistas, que teriam remunerado delegado diante da postura de Molina na repressão ao crime, além de vingança de policiais federais de Naviraí pelo “modo austero como Silvio Molina os abordava costumeiramente quando eles iam à cidade de Mundo Novo/MS para ‘namorar’ as meninas da cidade’”.

O magistrado destacou que as investigações começaram após alerta de órgão estadual, reuniu provas sólidas e a família já estava no radar de ações no Paraná (operação Piloto) e Ceará (Operação Cardume).

“Há de se convir que são três enredos completamente diferentes e não muito bem combinados, que acabam por evidenciar a baixa plausibilidade no núcleo central do argumento, a supor injusto assédio das autoridades federais, afora a pura falta de comprovação de quanto alegado”, afirmou o juiz.

Estilo ostentação – A apuração se desdobrou em descobertas de luxo, como festas de aniversários de R$ 100 mil, com direito a envio de avião para buscar convidado em Curitiba (Paraná); viagem para Londres e Paris (hospedagem com vista para a Torre Eiffel) e movimentações bancárias milionárias por meio de terceiros.

Contudo, a decisão pondera que a ostentação não foi tomada de forma isolada para condenar o grupo. “Ressalte-se que as provas que demonstram o elevado padrão de vida do núcleo familiar denunciado não são tomadas isoladamente; isto é, não se trata de um julgamento acerca do estilo de vida familiar, devendo o patrimônio ostentado ser visto à luz da já explicitada ausência de rendimentos lícitos que justifiquem a opulência e, especialmente, em face da ampla prova coletada de que comandavam amplo esquema de importação e remessa de entorpecentes em larga escala – afinal, as cargas apreendidas são todas de toneladas de maconha, que seriam revendidas por cifras milionárias, em especial no Nordeste brasileiro”.

A operação flagrou o tráfico de 23 toneladas de maconha, divididos em cinco carregamentos: 4,9 toneladas (Mundo Novo), 5,1 toneladas (Presidente Prudente), 3 toneladas (Guaíra), 10,3 toneladas (Guaíra) e 4 toneladas (Campo Grande).

Diagrama mostra relação entre réus e tráfico de 5,1 toneladas de maconha apreendidas em Presidente Prudente. (Foto: Reprodução)

Lucro de R$ 500 por quilo – A sentença explica a opção pelo tráfico de maconha, droga com valor de mercado inferior, por exemplo, ao da cocaína. Na faixa de fronteira com o Paraguai, o quilo da maconha era comprado por R$ 100. No Nordeste do País, o mesmo quilo valia R$ 600.

“A cada quilo a organização ganhava 500 (quinhentos) reais, e detinham a capacidade de posicionar grandes, enormes quantidades porque dominavam esse modal rodoviário de transportes em veículos de carga; isso garantia que a cada cinco toneladas o grupo atingisse dois milhões de reais, e esse dinheiro não era recebido só em espécie, também era recebido em veículos de luxo, veículos de toda sorte. Sob ditas condições, o tráfico de maconha era mais lucrativo que de outro tipo de droga, especialmente na Região Nordeste, onde esse entorpecente alcança um valor significativo”.

Conexão Nordeste – Um comprador em larguíssima escala era Adayldo Freitas Ferreira, o Adayldo Bebê, traficante de drogas sediado em Natal (Rio Grande do Norte). Durante as investigações, ele foi preso ao retornar do Paraguai em companhia de Jefferson Molina. Adayldo apresentou documento falso e trazia pistolas importadas.

No último dia primeiro, ele foi alvo de outra operação da Polícia Federal, a Héstia. Ele está foragido do sistema prisional do Acre desde 2017, quando fez buraco no forro de quarto de hospital, onde estava internado.

O mandando contra Bebê era para ser cumprido na comunidade da Maré, no Rio de Janeiro, mas a equipe da PF foi recepcionada a tiros. Conforme o jornal O Dia, o foragido vivia em imóvel de luxo, com direito a piscina e banheira de hidromassagem. Ele estaria sobre a proteção da facção criminosa TCP (Terceiro Comando Puro), rival do CV (Comando Vermelho) e aliançada ao PCC (Primeiro Comando da Capital).

O pagamento era em veículos de luxo, dinheiro e joias. A Justiça Federal decretou o perdimento do expressivo patrimônio: R$ 490 mil em dinheiro, joias avaliadas em R$ 81.334, relógios, duas estâncias, lote em Mundo Novo, apartamentos em Fortaleza e Campinas, três caminhões e outros 26 veículos.

Subtenente Silvio Molina está preso no Rio Grande do Norte. (Foto: Arquivo Pessoal)

Personalidade repreensível –  Ao assinalar a maior pena para Silvio Molina, líder intelectual do grupo, o juiz Bruno Teixeira destacou que a personalidade do réu se mostra repreensível.

“Devendo sofrer maior reprovação que o ordinário, ante a intimidação e a violência com que operava como já constante dos autos e supramencionado na presente sentença, o acusado Silvio Molina apresenta-se ostensivamente intimidador nas relações empreendidas na prática delituosa”.

A decisão lembra que ele foi denunciado como mandante de duplo homicídio em Minas Gerais. Outro ponto da sentença destaca que ele mandou equipe da PM abordar um veículo que considerou suspeito perto da sua casa. No caso, eram policiais federais que já o investigavam.

“Nesse toar, pode-se considerar que o acusado apresenta uma personalidade violenta e reprovável, o que impõe a majoração da pena nessa circunstância judicial”. O policial afastado segue preso desde a operação.

A defesa vai recorrer e aponta nulidade do processo. “Ele foi ouvido em Mossoró, por videoconferência, sem o seu advogado. Ouvido por advogado ad hoc [temporário]. A falta de imparcialidade restou clara nesse procedimento. A defesa está preparando essa apelação. A sentença tem pena exacerbada, as condutas não foram comprovadas nos autos e a sentença veio nessa envergadura. Foi assinalada a ele uma sentença de tráfico monstruosa. E essa mesma Justiça que é implacável contra Sílvio sequer deu um desfecho para a morte do filho”, afirma o advogado Marcos Ivan Silva.

Condenados – A lista de condenados também tem Douglas Alves Rocha (32 anos de reclusão), Jefferson Alves Rocha (4 anos e oito meses), Bonyeques Piovezan (7 anos e oito meses), Maicon Henrique Rocha do Nascimento (20 anos e 11 meses), Jair Rockembach (31 anos e 9 meses), Mayron Douglas Nascimento Velani (14 anos e 8 meses), Jonathan Weverton Caraiba (4 anos e 8 meses), João Clair Alves (9 anos e 8 meses), Adriano Feitosa Machado (3 anos), Kaique Mendonça Mendes (8 anos e 6 meses), Claudio Cesar de Morais (21 anos), Marcos Teixeira (28 anos), Adayldo Freitas Ferreira (19 anos) e Jeferson Batista de Souza (11 anos).

A advogada Lilian Peres Medeiros informa que vai recorrer da condenação contra Kaique Mendes, acusado de movimentar R$ 3 milhões. “Sequer foi reconhecida a menoridade relativa, apesar de mencionar que Kaique, na época, tinha entre 18 e 19 anos, o juiz ignorou o pedido e não aplicou. É possível baixar a pena na apelação”.

By Ellba Dark

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